João Jorge e Jacobina Maurer

João Jorge e Jacobina Maurer

I m A g E m

I m A g E m
O Velho do Espelho

"Por acaso, surpreendo-me no espelho:
quem é esse que me olha e é
tão mais velho do que eu?
Porém, seu rosto...é cada vez menos estranho...
Meu Deus,Meu Deus...Parece meu velho pai -
que já morreu"! (Mario Quintana)

P E S Q U I S A

terça-feira, 1 de abril de 2014

XX - MeMóRiA SiNDiCaL

 VIDAS CURTIDAS, VOZES DUBLADAS E SONHOS EXPORTADOS

Este texto é uma pequena parte de um trabalho de pesquisa realizado como Bolsista de Iniciação Científica do curso de História da Universidade Feevale, entre 2010 e 2011, com a coordenação da professora mestre Claudia Schemes. Neste capítulo abordo a questão da percepção do golpe civil-militar de 1º de abril de 1964, em Novo Hamburgo, a partir das edições do jornal NH.

Deslocamento de tropas de Minas Gerais, no dia 1º de abril de 1964, desencadeou o Golpe Civil Militar de 1964

O golpe civil militar - No  dia  4  de  abril  de  1964,  três  dias  após  o Golpe Civil Militar, o jornal NH divulga, em uma edição reduzida  notícias sobre o  ocorrido:  Novo Hamburgo não parou”, diz a manchete  de  capa,  seguida  de  um  texto:  Novo  Hamburgo  deu mais  um exemplo  à Nação  ao  não  tomar  conhecimento  do movimento  de  anarquia  que  se procurou estabelecer no País, com a queda do presidente João Goulart”. Além disso, informava que os trabalhadores e consequentemente, as indústrias continuaram suas atividades  na  cidade  e  nenhum  movimento  de anarquia  foi registrado. O Grupo Sinos se manifesta dizendo que são atitudes como essa que fazem Novo Hamburgo progredir.   

Ao lado da manchete de capa está a  foto  do  presidente  João Goulart. A  legenda  da  imagem  começa  com  a  seguinte escrita:  “O presidente que cai”. Um  texto breve narra a história política do  presidente e aparenta algum espanto ao afirmar: “Poucos  acreditavam  que  o presidente  que  articulara  seu  esquema  com  os  sindicatos  e  militares  menos graduados  caísse  tão  facilmente  do  poder”.  E  conclui  dizendo  que  o  ocorrido demonstrava a desorientação e fraqueza do governo Goulart cabendo ao Congresso a escolha de um novo presidente até as eleições marcadas para 1965.   Outras manchetes dizem “Trabalhadores estão conscientes que só o  trabalho trará  progresso  e  bem-estar  social”,  “Fé  no  futuro  governo”,  Prefeito:  Ficamos emocionados com a solução da crise nacional” e “Alano: Estamos desolados com o desenrolar  dos  acontecimentos”. 

Na Greve Geral de 1983 o jornal NH repetiu a notícia de 1964 só que desta vez como uma previsão

 De acordo com essas notícias,  mesmo  a  queda  de um presidente e o risco de uma guerra civil no país não deveriam preocupar Novo Hamburgo. Nenhuma crise seria capaz de afetar a economia crescente, ainda mais  que os  trabalhadores  não  aderiram a movimentos  de protesto e continuavam trabalhando dentro das  fábricas. 
 A declaração do prefeito da  cidade, Níveo Friedrich, mostra a posição da administração aliviada e comemorando que tudo tenha ocorrido de forma pacífica. A  declaração  do  vereador  e  presidente  da Câmara  de  Vereadores  do município,  Jaime  Alano, do  PTB de Jango, é uma tentativa de mostrar a  imparcialidade  do  jornal.  Na primeira página da edição de 4 de abril de 1964, é publicado um artigo de Vinícius Bossle  intitulado  Trabalho e Ordem”, fazendo um  balanço dos primeiros  dias  da ‘ guerra  civil’,  como  ele  define  a  situação reforçando  novamente a qualidade do povo hamburguense: patriotas exemplares que continuavam  trabalhando. Comparando essa situação ao dizeres da bandeira nacional: Ordem  e  Progresso,  Bossle diz: “Se  todos  trabalhassem  honestamente,  como  faz  o povo do Vale do Rio dos Sinos, que por isto mesmo é apontando como uma região de alto poder aquisitivo, certamente o Brasil não estaria em crise”. 
 Na contracapa  dessa mesma edição, de 04 de abril de 1964, a  coluna  chamada  “Gente  Importante    notícias  que poderiam  ser  manchetes” deixa clara a posição dos  diretores  do  jornal  em relação ao Golpe
“Finalmente o ambiente de  tensão que dominava o país  foi superado às 13 horas desta quarta-feira, quando o último foco de resistência, que se insurgiu contra o movimento de Minas e São Paulo  (e  de  todo o país), anunciou  sua  rendição. O Brasil    pode  trabalhar  livremente”. 



No dia 10 de abril de 1964 o Jornal NH traz como manchete  de  capa  a  seguinte  afirmação  “Nenhuma  prisão  em  Novo Hamburgo”,  fazendo  referência ao  fato de que, em centenas de  cidades do Brasil, estavam ocorrendo prisões de líderes comunistas, esquerdistas ou agitadores. Novamente o principal jornal da cidade expressa um desejo, um sentimento que busca disseminar pela cidade. 
É fato notório que houve, em Novo Hamburgo, interrogatórios e prisões nesse período. Alguns dos detidos eram pessoas públicas cujas agruras foram testemunhadas por diversas pessoas. Sem consultar nenhuma fonte de pesquisa e apenas buscando o registro da memória de pessoas que viveram aquele tempo podemos citar algumas pessoas que padeceram naqueles dias como: o ex-deputado trabalhista Seno Ludwig, os senhores Julio Bossle, o Bolota, Osvaldo Mossman, o professor Luis Osório de Albuquerque e os sindicalistas Antonio Bernardino, o Rancherinho,  Nelson de Sá e Guido Endress.  
Entre os casos mais conhecidos, que pleiteia até hoje uma justa indenização reparatória, encontra-se Tiago Lélis, um dos cadetes da base aérea de Canoas que sublevados haviam impedido o bombardeio do Palácio Piratini durante a Legalidade, em 1961, que foi preso e punido junto com vários oficiais e cadetes após o Golpe Civil Militar de 64. O próprio Nelson Eugenio Ritzel, que foi vereador e depois prefeito além de oficial da Brigada Militar, relatava que sofreu pressões e intimidações. Enfim, quase uma dezena de nomes sem necessidade de consulta a nenhuma fonte documental que não seja a própria memória dos mais idosos e dos integrantes movimento sindical. 
Em 1964 o presidente do sindicato dos comerciários de Novo Hamburgo, Guido Endress, foi detido para interrogatório.  Endress era assumidamente um comunista e ao concluir seu mandato na entidade, em 1966, decidiu não concorrer mais porque não havia garantias as liberdades individuais (SAUL, 1988). O sindicato dos comerciários ficou acéfalo e uma junta governativa da qual fazia parte Paulo Schüller, que depois seria vice-prefeito da cidade, foi nomeada para dirigir a entidade.



Numa das entrevistas realizadas para esse trabalho de pesquisa o vereador Carlos Gilberto Koch, o Betinho, que foi presidente do sindicato dos sapateiros de Novo Hamburgo relata a história de uma chapa de oposição que disputou e perdeu, por pequena margem de votos, a eleição para a direção do sindicato dos sapateiros, em 1968. Essa chapa liderada pelo trabalhador Antonio Bernardino de Souza, o Rancherinho, foi derrotada pela chapa de Orlando Müller que assumiu a presidência do sindicato nesse ano e permaneceu até 1986. Poucos dias após a eleição alguns integrantes da chapa derrotada foram detidos para investigação. Dois deles, o Rancherinho e Nelson Gautério de Sá foram levados para o DOPS onde permaneceram presos algum tempo. Afirmam que no momento da prisão os policiais valeram-se para identificá-los de fotos do cadastro de associados do próprio sindicato.  No depoimento do vereador Betinho ele narra outros episódios envolvendo Rancherinho e suas diversas passagens pelas prisões do DOPS.
Devemos registrar ainda um militar respeitado e condecorado de nossa cidade da família Schirmer, morador de Hamburgo Velho e autoridade militar na época, que em várias entrevistas demonstrava orgulho de ter  efetuado várias prisões em 1964 e posteriormente. Se a autoridade afirma que prendeu a história não pode registrar que não houve prisões.
 De volta ao NH,  na  página  10  dessa  edição de 10 de abril de 1964,  foi  publicada  a  opinião  de  diversos hamburguenses e todos se disseram a favor dos militares. Uns declararam  que    era tempo  de  ocorrer  uma reação contra o governo Goulart, outros disseram que eram a favor porque o terrorismo precisava ser combatido e outros agradeceram a revolução sem perdas de vida, a ação dos militares e diziam aguardar ansiosos pela chegada de um novo presidente. Nessas entrevistas realizadas pelo jornal, uma semana depois do golpe, qual a possibilidade de alguém manifestar-se contrário aos militares. E se tivesse havido manifestação contrária qual a possibilidade do jornal publicá-la nos idos de 1964?


Gilnei Andrade 
Acadêmico de História
1º de abril de 2014

3 comentários:

  1. Gilnei, que informações tu tem sobre o Orlando Müller? Dizem que ele era muito influente na região nos anos 70 e 80, mas que desistiu de concorrer a prefeito.

    ResponderExcluir
  2. Gilnei ,além da informação acima do senhor Guilherme, gostaria de saber porque na sua pesquisa histórica que deve ter sido das mais minunciosas, e demoradas, pois conseguiu localizar sindicalistas e politicos sem influ~encia alguma na cidade, pois se procura-se por Orlando Muller, citaria também que foi perseguido pelo Dops, Fez uma greve das maiores do Brasil na época com apoio de toda a classe calçadista,Viria uma reportagem que deu ao jornal Whashington Post dos Eua sobre a greve. que naquela época já tinha uma grande visão sobrea a importãncia da Saúde para i cidadão, vejo que é um historiador tendencioso, ou está no curso errado ou tem que trocar de faculdade. Historiador tem que contar história Real e não fazer de pessoas que até tiveram importãncia, mas não relevância Orlando Muller. Nada contra ninguém, comparar sindicalista Betinho Koch q foi presidente com 700 associados, com Orlando Muller que tinha 16 mil. faz favor;

    ResponderExcluir
  3. Caro Elcio Amauri, podes baixar a guarda e largar as pedras porque comigo não haverá peleia. Embora jovem no final dos anos 70 e anos 80 conheci Orlando Muller, tenho a impressão que também nos conhecemos pessoalmente e sei da ligação afetiva entre vocês. Essa postagem é um resumo, um excerto de um trabalho maior como consta bem em seu início quando afirma tratar-se de: "uma pequena parte de um trabalho de pesquisa realizado como Bolsista de Iniciação Científica do curso de História da Universidade Feevale, entre 2010 e 2011... onde abordo a questão da percepção do golpe civil-militar de 1º de abril de 1964, em Novo Hamburgo, a partir das edições do jornal NH".
    O texto é parte de uma pesquisa maior que posso te enviar, caso tenhas interesse, como toda pesquisa tem um recorte temporal e temático e aborda mais o período do chamado 'Novo Sindicalismo' do que o período do 'Populismo Assistencialista' dos anos 60 e 70 do século passado. As referências ao sindicalista Betinho Koch devem ser compreendidas no enfoque de uma testemunha ocular porque em 2010 e 2011, quando da pesquisa, já haviam falecido o Orlando Muller, Milton Rosa que o sucedeu, Alcides Rosa, Pedro Norcy ou o Augusto Edmundo Lichtler, o Fera. (este último, eu considero, a maior liderança operária de nossa cidade). O período do Orlando Muller surge mais em trabalhos como Classe Operária e Sindicalismo em Novo Hamburgo 1945/1964 do professor Carlos Vinicius de Almeida Saul que pode ser lido em: https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/106181
    /183775.pdf?sequence=1
    A pesquisa como um todo apresenta material, referências e disponho também de fotos não publicadas de Orlando Muller. Em relação a qualidade do meu trabalho, como acadêmico de História na época, podemos discutir pessoalmente mas entendo que a neutralidade e a independência nunca existiu na história nem em outras profissões porque a verdade não é única nem absoluta le vai sendo redescoberta e recontada ao longo de novos estudos, novas pesquisas e enfoques. Ficou a sua disposição. Abraços.

    ResponderExcluir